A Páscoa deveria ser a principal festa do cristianismo, já que celebra a vida e a morte de Jesus. “Ele mandou celebrar sua morte, não seu aniversário”, disse.
Getúlio Cidade, hebraísta e autor do livro A Oliveira Natural. (Foto: Captura de tela/Zoom) |
Por ocasião da chegada da Páscoa, muitos estão preocupados com o alto preço dos ovos de chocolate, as escolas estão contratando pessoas fantasiadas de ‘coelhinho’ e muitos ingredientes estão sendo comprados para o almoço de domingo.
Porém, segundo a Bíblia, esse movimento não está de acordo com as especificações dadas por Deus para a comemoração dessa festa. Para falar sobre isso, o hebraísta Getúlio Cidade e autor do livro “A Oliveira Natural” deu uma entrevista exclusiva ao Guiame.
Ele explica que a festa da Páscoa, segundo as Escrituras, é um tempo de celebração à liberdade e acontece no mês de Nisan, mês do nascimento de Isaque, filho de Abraão. Segundo a tradição judaica, ele foi amarrado como oferta sobre o altar no mesmo mês.
Importância do mês de Nisan
O mês de Nisan também marca outros eventos importantes para Israel, como a liberação do decreto de Artaxerxes para que Jerusalém fosse reedificada sob a liderança de Neemias, após décadas de abandono.
“A inauguração do tabernáculo no deserto também aconteceu no mês de Nisan, quando Arão começou a servir como sumo sacerdote e, pela primeira vez, desceu fogo do céu”, conforme o hebraísta em seu artigo “A Páscoa e o tempo de nossa liberdade”, publicado no site “A Oliveira Natural”.
O dia 10 de Nisan, em especial, ficou conhecido como o dia em que o povo de Israel atravessou o rio Jordão para tomar posse da Terra Prometida, depois de 40 anos de peregrinação.
E, cerca de 1.300 anos depois, também no dia 10 de Nisan, Jesus fez sua entrada triunfal dentro dos muros de Jerusalém, cumprindo a profecia de Zacarias 9.9, conforme especifica o hebraísta.
Mas, de todas as datas importantes do mês de Nisan, nenhuma delas é tão conhecida como a Páscoa.
Calendário de Deus
No período de 7 dias, entre 15 a 21 de Nisan, em Israel, são comemoradas três festas, simultaneamente — Páscoa (Pesach), Pães Asmos (Hag HaMatzot) e Primícias (Hag Bikkurim).
Dia 15 a 21 de Nisan / Páscoa — Para os judeus, a Páscoa é uma festa que dura 7 dias para a comemoração da liberdade. Na época, essa liberdade aconteceu após a retirada do povo judeu do Egito.
Dias 15 a 21 de Nisan / Pães Asmos — É uma festa comemorada em conjunto com a Páscoa e se resume em preparar os pães sem nenhum fermento. Simbolicamente, o fermento é o pecado do homem, ou seja, toda maldade que contamina o coração. Comer o pão sem fermento, durante as comemorações da Páscoa, simbolizava seguir uma vida de pureza e santidade.
Dia 17 de Nisan / Festa das Primícias — No primeiro dia da semana, era quando o sacerdote apresentava a oferta movida a Deus, com as primícias da colheita do povo. Foi justamente nesse dia que Jesus ressuscitou, tornando-se primícia entre os que dormem.
As três festas estão conectadas diretamente ao Messias e à sua primeira vinda para salvar a humanidade de seus pecados. Elas eram observadas normalmente pela Igreja no século I, antes de ser absorvida pelo Império Romano, quando muito paganismo se mesclou à fé cristã.
Páscoa: diferença da celebração entre judeus e cristãos
Embora a festa seja a mesma, Getúlio explica que na cultura judaica ela se limita a comemorar a libertação do povo de Israel do Egito. Somente 1.300 anos depois foi que Jesus morreu na cruz e ressuscitou para se revelar como Messias.
“O livro de Êxodo conta toda a história de como foi estabelecida a Páscoa e que ela deveria estar em estatuto perpétuo. No dia 14 de Nisan aconteceu a preparação e no dia 15 aconteceu a saída do Egito. O povo levou 7 dias para chegar até o Mar Vermelho e é por isso que a festa tem essa duração”, explicou.
“Para nós, cristãos, essa festa tem um significado muito profundo. A simbologia é ampla e perfeita — Jesus é o cordeiro ferido e morto para salvar a humanidade e o Egito é o mundo em que vivemos”, compartilhou.
“O pecado, simbolizado pelo fermento, é uma forma de escravidão que nos prende ao mundo. Faraó simboliza satanás que insiste em escravizar a alma das pessoas. As águas do Mar Vermelho representam a nossa passagem da morte para a vida”, continuou.
Ovo de Páscoa, coelho e profanação
De acordo com o hebraísta, até a data da Páscoa foi desvinculada do cenário bíblico. “Hoje em dia, uma coisa não tem nada a ver com a outra. Outros elementos que entraram para a celebração da Páscoa são resultado do paganismo e da profanação”, disse.
Ele também explica que a data 14 de Nisan é fixa, então em cada ano ela cai num dia diferente do calendário. Por esse motivo, não faz sentido falar em “sexta-feira santa”, por exemplo.
“A profanação vem da Babilônia, onde havia a deusa da fertilidade, também conhecida como Ishtar, rainha dos céus ou Astarote, entre outros nomes, mas a entidade era a mesma”, especificou.
Segundo Getúlio, na crença popular da época, essa deusa havia descido do céu através de um enorme ovo e havia celebrações feitas a ela. Como a Páscoa teve sua data alterada, as duas festas se misturaram e os costumes também.
“Era costume durante as celebrações babilônicas, a distribuição dos ovos de Ishtar. Além disso, havia uma representação através do coelho que simbolizava a fertilidade”, associou.
A ligação do coelho, nesse caso, não é associada ao ovo, pois os coelhos são mamíferos. Mas, como Ishtar era considerada a ‘deusa da fertilidade’, o coelho servia de representação graças à sua intensa prática reprodutiva.
“A profanação foi praticamente imediata e, durante as festas da primavera, passou a ser comemorada a festa de Ishtar e a festa da Páscoa. O problema é que as pessoas não diferenciam as coisas pagãs das coisas sagradas”, disse ainda.
“Cristãos deveriam observar o calendário bíblico”
Para o hebraísta, os cristãos deveriam focar mais nas datas bíblicas para as festas que Deus instituiu. “O dia 14 de Nisan é tão importante para Deus, que Jesus foi crucificado nesse mesmo dia e no mesmo horário dos sacrifícios no Templo, 1.300 anos depois”, apontou.
Durante os 13 séculos, ano após ano, conforme especifica Getúlio, o sacrifício de cordeiros era feito até chegar o grande dia de sacrificar o Cordeiro de Deus — Jesus Cristo.
“Então, essa festa deveria ser a mais importante para os cristãos. Deveríamos honrar o sacrifício do Senhor em 14 de Nisan e não a tal da sexta-feira santa”, observou.
O hebraísta sugere o “Seder” ou uma refeição em família, como a que Jesus fez ao se assentar com os discípulos para comer os pães asmos, ervas amargas e tomar os cálices com vinho.
“Não na igreja ou nas sinagogas, mas nas próprias casas, convidando amigos e vizinhos para celebrar a vida e a morte de Jesus por nós, porque ele mandou celebrar sua morte. Em nenhum momento, as Escrituras mandam celebrar seu aniversário”, alertou.
A Páscoa e os quatro cálices do Seder
Durante o Seder — uma refeição bastante demorada, pois os judeus contam toda a história do Êxodo — o hebraísta explica que eles bebem quatro cálices de vinho, que simbolizam as quatro promessas que estão em Êxodo, capítulo 6.6-7.
“O primeiro cálice, bebido logo no início do Sedar, é o cálice da santificação. Ele simboliza a promessa que Deus fez de livrar Israel das cargas dos egípcios”, disse.
“O segundo faz referência ao livramento do povo de Israel e, ao mesmo tempo, ao juízo sobre o povo egípcio. É um cálice tomado não com muita alegria, pois Deus não se alegra da destruição e nem da morte do ímpio”, continua.
“O terceiro é o mais importante de todos para nós, já que simboliza a redenção. Foi quando Jesus instituiu a Ceia do Senhor, pois era o cálice da salvação. E o quarto cálice simboliza o louvor e está associado ao Salmo messiânico 118, que foi cantado pelo próprio Jesus”, disse ainda.
“A Páscoa é, talvez, a principal festa bíblica e a nossa melhor oportunidade de compreender nossas raízes judaicas, que estão em Israel. Desejo que nessa Páscoa, o Messias se revele, que as pessoas busquem a santidade de Deus. O Cordeiro de Deus está entre nós e deve ser celebrado”, concluiu.