Estudantes universitários de diferentes países relataram suas experiências como cristãos nas faculdades.
Jovem estudante. (Foto: Ilustração/Unsplash/Scott Webb) |
Um estudo publicado pelo Observatório sobre Intolerância e Discriminação Contra Cristãos na Europa (OIDAC — sigla em inglês) em 2022, expôs a realidade da autocensura, mais comum entre os cristãos universitários.
Um documentário baseado neste estudo foi lançado em janeiro de 2024. Nele, os estudantes admitem ficar quietos quando acreditam que deveriam falar sobre sua fé.
Pensando em até que ponto a autocensura os afeta, estudantes da Bélgica, Inglaterra, França, Viena, Espanha, Hungria, Alemanha, Irlanda e Peru foram entrevistados e compartilharam experiências.
Eles encontraram um ponto comum em seus relatos de autocensura. Juntos, eles exploraram o que podem fazer para promover "uma atmosfera que permita a liberdade de expressão".
Por que se auto censuram?
Muitos dos alunos entrevistados disseram que se censuraram por aceitação social. Mary, da Irlanda do Norte, teve um professor ateu que fez "afirmações horríveis" sobre Deus na sala de aula.
"Eu não queria ficar de pé em frente a outras 300 pessoas que estavam rindo e achando engraçado. Senti que eu estava contra o mundo, e senti que não conseguia falar”, disse ela.
Valeria, do Peru, começou a se censurar quando entrou na universidade: "Eu me lembro de não esconder minha fé, mas eu definitivamente não estava aberta sobre isso. Eu pensava: 'Não vou dizer nada'", relatou.
Yusuf mora na Hungria, mas nasceu na Nigéria. Ele explicou que sua educação na Nigéria desempenhou um papel em sua autocensura.
"A situação na parte norte da Nigéria está ficando um pouco ruim. Se há um evento que pode provocar alguma indignação, então é quando os cristãos geralmente têm que temer por suas vidas", contou ele.
Markus, de Viena, acrescentou: "Tenho a sensação de que o cristianismo é um grande tópico na sociedade. É um grande tópico na universidade, mas é tão difícil falar sobre isso".
Ameaças e intimidação
Mafe, da Espanha, foi a única aluna que expressou opiniões contra o aborto quando um de seus professores mencionou o assunto em aula.
"A professora estava tentando criar uma conversa, mas isso se transformou em um ataque", disse ela.
E continuou: "Depois dessa conversa, recebi uma ameaça de morte. Meu colega de classe me disse: 'Eu conheço o metrô que você pega todos os dias, então tenha cuidado'".
Mafe teve que ser escoltada para casa por policiais durante um mês.
"Eles sempre me fizeram sentir tão mal por compartilhar minhas crenças ou meu jeito de viver. Aprendi ao longo do tempo a ter muito cuidado com o que eu ia falar", afirmou a aluna.
Mary gerenciava as mídias sociais para a sociedade pró-vida em sua universidade. Através da plataforma, ela recebia constantes ameaças de morte e comentários maliciosos de usuários que contavam de que maneira a prejudicariam.
"Estou mais do que feliz em compartilhar minhas crenças, mas se isso vai resultar em ataques pessoais como esse, é muito difícil de encarar enquanto ando pelo campus com pessoas sabendo quem você é", disse ela.
Para Valeria, esses comportamentos foram normalizados até certo ponto: "Acho que essas coisas não são vistas como uma agressão".
Estereótipos desafiadores
Sixtine, da França, disse que uma vez teve uma colega de quarto que era ateia. No final do período em que passaram juntas, a menina disse que os cristãos não eram como ela pensava.
"Acho que minha colega de quarto achou que éramos realmente extremos em nossas ideias e qualquer outra coisa. Enquanto morava comigo, ela descobriu que não era o caso", contou ela.
Sara, da Alemanha, também criou estereótipos precipitados e achou que os cristãos seriam chatos.
"Eu nunca pensei que iria adorar", disse ela. Hoje, Sara é uma seguidora de Jesus e ama compartilhar sua fé com os outros.
“Eu tive experiências muito boas quando você tem a coragem de apenas falar. É uma perspectiva completamente diferente da que o mundo tem em algumas áreas", afirmou ela.
Alguns alunos reconheceram que certas atitudes podem contribuir para a distorção do cristianismo.
"Às vezes, pessoas se aproveitam do cristianismo para poder obter votos. Eles podem não representar adequadamente o que somos", disse Yusuf.
"No Reino Unido, você pode ver pessoas que seguram placas nas ruas que dizem: 'Se você não nos seguir, vai para o inferno'. Eu não acho que isso seja útil para ninguém", explicou Mary.
No secreto
Muitos alunos destacaram a sensação de que sua fé tinha que ser algo discutido no privado.
Nos primeiros anos depois que Yusuf viajou para a Hungria, ele relatou: "Eu pensei que havia uma lei não escrita em algum lugar que as pessoas simplesmente pensavam: 'Se você acredita, então deixe que seja entre você e seu Deus e nos deixe fora disso'", disse ele.
"Eu me senti como se na Europa, todo mundo pregasse a mensagem de que a religião é uma coisa individual", acrescentou o estudante.
Markus explicou que é mais fácil compartilhar convicções cristãs em conversas individuais, mas "se você falar em um grande salão ou em um grupo de discussão, está ficando muito difícil".
"Estou no mesmo local de trabalho há 16 meses e acho que eles não sabem que sou cristão. Eu não escondo, só não falo sobre isso", contou Wouter, da Bélgica.
Valeria discordou dessa abordagem. Ela acredita que é inaceitável que um cristão tenha que esconder sua identidade de filho de Deus:
"Hoje as pessoas podem dizer: 'Sim, acredite no que quiser, mas guarde para si mesmo'. Esses alunos veem sua fé cristã como parte integrante de quem eles são como pessoas, em vez de algo para manter privado”.
"É a melhor maneira de ser quem eu sou", disse Sixtine.
O que pode ser feito?
Os alunos entrevistados no estudo também foram questionados sobre o que eles poderiam fazer para criar uma atmosfera em que os princípios cristãos não fiquem deixados de lado.
"Às vezes falamos sobre o que acreditamos ser verdade, mas realmente não entendemos por que acreditamos", disse Wouter.
De modo geral, esses alunos entenderam que, não importa as circunstâncias, seguir Jesus ainda poderia trazer situações negativas.
Daniel, da Inglaterra, citou George Orwell, que disse: "Se a liberdade significa alguma coisa, significa o direito de dizer às pessoas coisas que elas não querem ouvir".
Ele acredita que "uma das melhores coisas que os alunos podem fazer é ser mais corajosos e francos sobre o que querem em sua universidade".
Porém, ele também explicou que viver plenamente como cristão pode ter consequências negativas, mesmo que o crente não seja completamente rejeitado.
"Possivelmente, você pode perder alguns amigos que pensam que de repente você se tornou intolerante ou o que quer que seja", disse ele.
Outros alunos concordaram que a atmosfera social polarizada classifica algumas visões e crenças como ofensivas.
Segundo eles, isso diminui a liberdade de expressão e torna os debates sobre tópicos controversos menos propensos a ocorrer, aumentando a autocensura.